OS CAUSOS DE JOAQUIM MEU SOGRO.
Causo 8
Em 1946 meu sogro atravessava um período muito difícil em Guaraciaba. A encomenda de consertos em sua sapataria ia de mal a pior. Sem falar no fiado e nos folgados que buscavam os sapatos meses depois. Para complicar, a remuneração pelos serviços mal cobria os custos.
Com três filhos para criar e as contas no comércio só aumentando, Joaquim tomou uma decisão drástica. Decidiu ir para o Rio de Janeiro. José Duarte, seu irmão mais velho, morava na capital federal. Joaquim pegou o trem de Ponte Nova para Belo Horizonte e daí par o Rio.
Seu irmão o esperou na estação da Central do Brasil e de lá foram imediatamente para a casa de José Duarte.
Após o almoço, seu irmão saiu para o trabalho e recomendou a Joaquim que não saísse de casa. À noite, quando voltasse, sairia com Joaquim para lhe mostrar um pouco do Rio de Janeiro. Joaquim estava deslumbrado.
Imaginem um cidadão de Guaraciaba, então com 3 ou 4 mil habitante, chegando a uma metrópole com 3,5 milhões da habitantes, e capital da república ainda por cima?! Choque cultural, espanto e todo o mais contrastando a bucólica Guaraciaba com o frenesi e o lusco-fusco de gente pra lá e pra cá, bondes, carros, trânsito - um atordoante burburinho da cidade grande.
Mal José Duarte virou as costas e Joaquim escapuliu. Com os trocados recebidos do irmão pegou um bonde, depois outro e outro e foi parar na Cinelândia. Olhava vitrinas, ia e voltava, quando foi abordado por um típico malandro carioca: terno de linho branco, sapato bicolor e aquela conversa mole cheia de "esses". O Malandro tinha nas mãos alguma coisa muito bem embrulhada. Puxou conversa com Joaquim e lhe disse que sua mãe estava muito doente e que fora internada às pressas. Precisava comprar remédios para ela e só dispunha daquele corte de linho 120, coisa fina. Ofereceu o corte por 800 cruzeiros e disse que era uma pechincha. Joaquim agradeceu e lhe disse que chegara ao Rio de Janeiro naquele dia mesmo e que não tinha nem a quinta parte do valor pedido pelo corte de linho. O Malandro deu uma risadinha marota e lhe disse que percebera que ele era do interior. Disse que simpatizara muito com Joaquim e baixou o valor para 500 cruzeiros. Joaquim agradeceu a consideração mas recusou oferta. O Malandro não desistiu e baixou para 250 cruzeiros. Diante da insistência do gentil carioca, Joaquim lhe fez uma contra-proposta, frisando que ficara comovido com o drama pelo qual o cidadão estava passando. Propôs ficar com o corte de linho, só que traria o dinheiro no dia seguinte. Pediu o endereço do local onde estavam, de modo que neste mesmo horário, amanhã, voltaria para fazer o pagamento. O Malando deu uma gostosa gargalhada, deu-lhe um tapinha nas costas e sumiu. Joaquim não entendeu nada.
O tempo passou e já eram 8 horas da noite. Cadê Joaquim? José Duarte estava desesperado. Antes havia percorrido todas as delegacias das imediações, com passagem por hospitais e até pelo Instituto Médico Legal.
Lá por volta das 10 da noite, com a cara mais limpa do mundo, Joaquim chegou na casa de seu irmão. Levou uma descompustura geral e foi dormir o sono dos justos e inocentes.
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