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21/11/2014

Estou pensando no 8 e no 80. Explico: ontem morreu o fundador das Casas Bahia, Samuel Klein. Seu Samuel, como era chamado pelos funcionários da rede fundada por ele, era polonês. De família muito pobre, Samuel e seus irmãos eram tão desvalidos que não tinham sapatos. No rigoroso inverno polonês, enrolavam os pés com panos para minimizar os efeitos do frio.
Samuel e família passaram pelo horrores dos campos de concentração nazistas. O pai, a mãe e 5 irmãos não sobreviveram. Samuel nunca mais os viu. 
Samuel sobreviveu à guerra e perto dos 30 anos veio para o Brasil. Começou com um pequeno comércio, onde vendia tecidos e peças de roupa e banho. Algum tempo depois, abriu uma lojinha. Era o início - o iníciozinho das Casas Bahia.
Observador da vida e das pessoas, um belo dia Samuel pensou lá com os seus botões: ninguém faz prestação para gente pobre. Ninguém confia neles. Gozado é que os pobres são os melhores pagadores. Pagam em dia por muitas razões: em primeiro lugar são gente honrada, religiosa, temente a Deus; segundo, eles sabem que o seu nome é tudo o que possuem. Se perdem o nome, se não o mantém limpo, aí é que eles não arrumam nada. Vou vender para o povo. Vou vender pra eles a prestação. Vou confiar neles.
Seu Samuel inventou o carnet e as Casas Bahia estouraram no norte e depois vieram fazer bonito no sul e por todos os cantos do Brasil. 
Samuel Klein deu continuidade, no plano comercial, a uma belíssima história de vida. Foi um exemplo de superação, de trabalho e de outras tantas virtudes embutidas em uma e outro.
No mesmo dia morreu o famoso advogado Márcio Thomaz Bastos. Márcio causídico famoso, criminalista, e neste mister defendeu bandidos de colarinho branco, verde e amarelo - estes últimos encontrados aos borbotões em Brasília, em capitais de estado e em outras paragens que gravitam em torno do poder e do capital. 
Márcio foi Ministro da Justiça de Lula em todo o seu primeiro mandato. 
O direito de defesa é princípio consagrado na constituição. Tá certo. Eu, no entanto, pela parte que me toca, fosse advogado famoso, rico, por conseguinte, jamais defenderia gente desta "qualidade". Que outros defendessem - e o fariam por dinheiro na frente e total ausência de ética no vácuo.
Ministro de Estado do Lula é outra coisa que não me cheira bem. Diga-me com quem andas e te direi quem és - diz o velho ditado popular. Para bom entendedor, meia palavra basta.
Márcio Bastos foi notícia de destaque nos principais jornais e telejornais. A morte de Samuel Klein ficou restrita a espaços menores e a poucos segundos no Jornal Nacional da onipresente Rede Globo.
O velório de Márcio Thomaz Bastos foi prestigiado por autoridades peso pesado: Lula, Dilma e muitos outros figurões compareceram e assinaram o livro de presença fúnebre.
No enterro de Samuel Klein, a família, os amigos, antigos funcionários, representantes do comércio, da indústria e certamente populares curiosos ou gratos ao homem que vendeu fiado para eles - um fiado chique, antes caderneta e após Samuel, carnet.
8 ou 80...A vida é assim: 8 ou 80, bunda de fora ou calça de veludo. Não há meio termo. Samuel foi 80 e Márcio 8. Samuel deve ter entrado no céu com calça de veludo e Márcio, talvez no purgatório, tapando as partes pudentas.
No mundo dos homens, 80 é a medida dos notáveis. Porque são notáveis, e ponto final. 8 é medida para os outros - ainda que tenham sido muito mais notáveis.

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