Reeditando (por puro atrevimento).
DIVAGAÇÕES SOBRE A ARTE MODERNA
O museu estava lotado. Um sujeito parou em frente a um cubo feito com conexões da Tigre ou Amanco. O cubo flutuava, rodando, amarrado ao teto por uma linha de nylon.
Com a mão no queixo ele contemplava a obra embevecido. Assim permaneceu por mais de uma hora. Começava a chamar a atenção dos presentes a sua fisionomia compenetrada diante da obra.
Começou a juntar gente. A obra foi envolvida por centenas de pessoas.
Silêncio absoluto e um ou outro comentário, em voz baixa, acerca da genialidade do autor.
Esqueci de mencionar que eu pertencia ao grupo de admiradores. De repente um amigo meu aproximou-se e falou comigo em voz baixa, de modo a não perturbar a contemplação da obra: E aí, cara, o que você acha?
Minha estupefação traiu o meu bom senso e eu, descuidado, opinei com um tom de voz mais alto do que deveria dizendo que aquilo era uma merda, uma tremenda enganação.
Todos se voltaram para mim. O sujeito (aquele que citei embevecido) não se conteve e se aproximou de mim.
Olhou-me de cima abaixo com um ar de pena e de indignação. Não se conteve e disse que eu não deveria frequentar lugares onde eu me comportasse como um semovente diante de um castelo.
Pensei em revidar à altura de sua petulância. Não. Era melhor argumentar civilizadamente.
O senhor gostou da obra? Por quê?
Com ar professoral ele me disse que não apenas gostara mas que amara a obra do artista fulano de tal.
Mas é um cubo de conexões Tigre ou Amanco, ponderei.
Onde o senhor vê apenas um cubo, de fato o artista representa o mundo, o planeta.
Como assim?!...o mundo é redondo!
Com o mesmo olhar de piedade, meu oponente explicou que eu precisava ter um olhar menos convencional e que o mundo não deve ser visto como uma mera circunferência levemente achatada nos polos. Este achatamento não passa de um eufemismo geográfico. O planeta é, em essência, cheio de ângulos e arrestas. Estas arestas existem e representam os conflitos existenciais, as diferenças, os antagonismos. A conformação esférica do planeta é uma ilusão. O artista teve a sensibilidade de captar a forma real da Terra, posto que a sua aparência real não corresponde ao seu aspecto físico retratado nos atlas geográficos e fotografias astronômicas. A Terra é um corpo celeste cuja forma é uma ilusão de ótica. A terra, meu caro, no plano etéreo, é como um pequi.
Nosso diálogo, ou melhor, o monólogo de meu impaciente instrutor captou a atenção dos circundantes.
Uns e outros, sussurrando, davam os seus pitacos em voz baixa. Percebi que a maioria concordava comigo e que aquela merda era apenas um cubo de conexões hidráulicas suspenso que rodava lentamente.
Não valia a pena argumentar com o cidadão entendido. Mas para não me dar por vencido, olhei bem dentro de seus olhos e lhe disse que gostaria de ter uma máquina do tempo disponível nem que fosse por alguns segundos.
Como?!...
Explico: eu traria Da Vinci, Goya, Rembrandt, Veslaquez. Ou então Van Gogh, Rubens,Ticiano, Caravaggio, Rafael, Michelangelo e gostaria de saber as suas respectivas opiniões sobre esta coisa pendurada aí.
O senhor está apelando, rebateu o entendido. O contexto histórico era outro...
O senhor tem razão. Naquela época não existiam conexões hidráulicas.
E nem "artistas" tão "ousados". Espero que o senhor acredite que não sou contra a arte moderna. Vi algumas obras de arte que me impressionaram. Muito poucas, admito. Apenas me reservo o direito de não me deixar levar por opiniões que, como a sua, vêem arte onde ela inexiste. Este cubo é um engodo. Aposto que algum crítico de arte famoso elegeu esta "obra" como algo deslumbrante e digna de todos os elogios. Daí o seu sucesso e a sua admiração desmedida.
O círculo se abriu e o entendido saiu bufando incomodado com o riso dos presentes.
Ufa!...saí de alma lavada e pensando seriamente em abrir o meu ateliê. As coisas não andam bem para o meu lado. Vou começar a pintar. Quero que a minha neta Belinha me ajude, uma vez que ela não impõe limites à sua imaginação. Quem sabe nós dois produziremos uma tela, escultura ou massinha que encante um crítico famoso?
Com a mão no queixo ele contemplava a obra embevecido. Assim permaneceu por mais de uma hora. Começava a chamar a atenção dos presentes a sua fisionomia compenetrada diante da obra.
Começou a juntar gente. A obra foi envolvida por centenas de pessoas.
Silêncio absoluto e um ou outro comentário, em voz baixa, acerca da genialidade do autor.
Esqueci de mencionar que eu pertencia ao grupo de admiradores. De repente um amigo meu aproximou-se e falou comigo em voz baixa, de modo a não perturbar a contemplação da obra: E aí, cara, o que você acha?
Minha estupefação traiu o meu bom senso e eu, descuidado, opinei com um tom de voz mais alto do que deveria dizendo que aquilo era uma merda, uma tremenda enganação.
Todos se voltaram para mim. O sujeito (aquele que citei embevecido) não se conteve e se aproximou de mim.
Olhou-me de cima abaixo com um ar de pena e de indignação. Não se conteve e disse que eu não deveria frequentar lugares onde eu me comportasse como um semovente diante de um castelo.
Pensei em revidar à altura de sua petulância. Não. Era melhor argumentar civilizadamente.
O senhor gostou da obra? Por quê?
Com ar professoral ele me disse que não apenas gostara mas que amara a obra do artista fulano de tal.
Mas é um cubo de conexões Tigre ou Amanco, ponderei.
Onde o senhor vê apenas um cubo, de fato o artista representa o mundo, o planeta.
Como assim?!...o mundo é redondo!
Com o mesmo olhar de piedade, meu oponente explicou que eu precisava ter um olhar menos convencional e que o mundo não deve ser visto como uma mera circunferência levemente achatada nos polos. Este achatamento não passa de um eufemismo geográfico. O planeta é, em essência, cheio de ângulos e arrestas. Estas arestas existem e representam os conflitos existenciais, as diferenças, os antagonismos. A conformação esférica do planeta é uma ilusão. O artista teve a sensibilidade de captar a forma real da Terra, posto que a sua aparência real não corresponde ao seu aspecto físico retratado nos atlas geográficos e fotografias astronômicas. A Terra é um corpo celeste cuja forma é uma ilusão de ótica. A terra, meu caro, no plano etéreo, é como um pequi.
Nosso diálogo, ou melhor, o monólogo de meu impaciente instrutor captou a atenção dos circundantes.
Uns e outros, sussurrando, davam os seus pitacos em voz baixa. Percebi que a maioria concordava comigo e que aquela merda era apenas um cubo de conexões hidráulicas suspenso que rodava lentamente.
Não valia a pena argumentar com o cidadão entendido. Mas para não me dar por vencido, olhei bem dentro de seus olhos e lhe disse que gostaria de ter uma máquina do tempo disponível nem que fosse por alguns segundos.
Como?!...
Explico: eu traria Da Vinci, Goya, Rembrandt, Veslaquez. Ou então Van Gogh, Rubens,Ticiano, Caravaggio, Rafael, Michelangelo e gostaria de saber as suas respectivas opiniões sobre esta coisa pendurada aí.
O senhor está apelando, rebateu o entendido. O contexto histórico era outro...
O senhor tem razão. Naquela época não existiam conexões hidráulicas.
E nem "artistas" tão "ousados". Espero que o senhor acredite que não sou contra a arte moderna. Vi algumas obras de arte que me impressionaram. Muito poucas, admito. Apenas me reservo o direito de não me deixar levar por opiniões que, como a sua, vêem arte onde ela inexiste. Este cubo é um engodo. Aposto que algum crítico de arte famoso elegeu esta "obra" como algo deslumbrante e digna de todos os elogios. Daí o seu sucesso e a sua admiração desmedida.
O círculo se abriu e o entendido saiu bufando incomodado com o riso dos presentes.
Ufa!...saí de alma lavada e pensando seriamente em abrir o meu ateliê. As coisas não andam bem para o meu lado. Vou começar a pintar. Quero que a minha neta Belinha me ajude, uma vez que ela não impõe limites à sua imaginação. Quem sabe nós dois produziremos uma tela, escultura ou massinha que encante um crítico famoso?
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